sexta-feira, 11 de julho de 2014

A JAC Motors, o Brasil e os Veículos Elétricos


Depois de uma longa crise, que foi desencadeada, não apenas por uma série de medidas protecionistas que foi implementada pelo governo brasileiro, com aumento de impostos sobre carros importados e exigência de uso de conteúdo nacional para as fábricas interessadas em se instalar no Brasil mas, também, por um continuo e relativamente elevado índice de reclamações de clientes, não apenas por causa de uma alegada qualidade duvidosa das peças e da montagem dos produtos mas, mais ainda, pela alegada má qualidade da assistência técnica pós-venda prestada pela rede de concessionárias JAC Motors, a empresa parece, agora, ter estabelecido um "novo acordo" consigo própria e voltado a uma estratégia agressiva de mercado.

A chinesa JAC Motors, que há um ano anunciou a vinda dos novos JAC J3 e J3 Turin ao Brasil, já confirmados como modelos 2014, e recentemente o JAC T6, vivenciou como nenhuma outra empresa que vende veículos importados no Brasil, tanto os efeitos das medidas do governo, que estabeleceu alíquota extra de 30% do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para carros importados, como as dificuldades encontradas com um bom número de clientes, com vendas despencando mês a mês, mesmo depois de um começo de primeiro ano, que parecia ser bastante promissor.

Em 2010, o Grupo SHC, presidido pelo empresário Sérgio Habib, anunciou parceria com a JAC Motors e se tornou responsável pelo marketing, comercialização, assistência técnica, pós-venda, e distribuição de peças originais da marca. Antes,o mesmo grupo havia sido pioneiro em trazer a marca Citröen para o Brasil. A parceria parecia perfeita.

O plano consistia em comercializar quatro modelos: o sedã médio J5, o monovolume J6 e o compacto J3 nas carrocerias hatch e sedã, os quatro com itens de série como freios ABS, ar-condicionado digital, airbags frontais e laterais e CD Player.

Ao grupo SHC cabia estabelecer uma rede de 50 concessionárias da marca, inaugurando-as de uma só vez, distribuídas nas principais cidades brasileiras e o objetivo futuro da parceria era o de comercializar 50 mil unidades em 2012, quando o número de pontos de vendas já teria se expandido para 100.

Era preciso garantir que os veículos passassem por exigentes testes de rodagem. Ao todo foram rodados mais de 1 milhão de km com cada modelo e, dessa forma, foi possível realizar alegados acertos de suspensão, acabamento interno, motor e conforto compatíveis com o gosto do brasileiro.

Para entrar no concorrido mercado automobilístico nacional, a marca decidiu apostar em uma estratégia arrojada, com preço acessível e seis anos de garantia. O apresentador Fausto Silva (Faustão) foi convidado pela JAC Motors para ser o garoto propaganda da marca no país.

Vista sobre o capô dianteiro do motor elétrico do JAC Yueyue

Já no salão de automóvel de São Paulo, em 2010, a JAC Motors havia dado um primeiro sinal que ela estava caminhando em direção a um futuro mais sustentável. Naquela edição do evento, a marca expôs um protótipo totalmente elétrico do J5, modelo mais luxuoso da marca comercializado no Brasil.

Vale lembrar que, no período de 2007 a 2010, o Brasil havia pulado de 9° para 4° maior mercado consumidor automotivo em 2010. Devido a esse rápido crescimento, que surpreendentemente deixou para trás grandes mercados consumidores como Alemanha, França e Índia; o país se tornou prioridade nas estratégias de crescimento de novos investidores, que dispunham de capital e produtos compatíveis com o gosto do consumidor local.

Isso fez impulsionar, principalmente, o mercado nacional de veículos importados pois, no mesmo período, apesar de também crescer em números absolutos, as vendas das montadoras instaladas no Brasil caiu em média, com relação aos seus percentuais de participação no mercado, conforme o gráfico abaixo:

Participação de Mercado 2007-2010 - Fonte: FENABRAVE, ABEIVA, JATO Dynamics e Montadoras

Em 01/08/2011, a JAC Motors anuciava, oficialmente, a construção de uma planta da montadora no Brasil. O presidente da marca no país, Sergio Habib, assinou, na ocasião, um protocolo de intenções para esta construção, juntamente com o vice-presidente mundial da JAC Motors, Dai Maofang. Esta seria a primeira incursão da JAC Motors na construção de uma fábrica fora do território chinês, com intensão de investimento de US$ 600 milhões na construção da unidade, com capacidade para produzir 100 mil veículos por ano, gerando cerca de 3.500 empregos diretos e 10.000 indiretos.

O investimento seria conjunto entre a JAC Motors e o Grupo SHC, que, então, representava totalmente os negócios da marca JAC Motors no Brasil. O momento era muito positivo, pois a parceria JAC-SHC já havia conquistado cerca de 1,1% das vendas totais do mercado brasileiro, em apenas quatro meses de operação no país e, em pouco mais de dois meses, Sergio Habib anunciava que o plano era construir a fábrica na Bahia, com um custo R$ 900 milhões, rateado com 80% de capital brasileiro.

Todavia, Habib também declarava que, o aumento do IPI sobre carros importados poderia dificultar o negócio. Mas disse que o governo aceita flexibilizar a medida: "Se o governo não fizer mudança [no imposto sobre carros importados], nós não podemos fazer a fábrica. Mas eu te digo. Eu estive lá. Eu estive em Brasília. O governo está disposto a estudar mudanças para permitir a implementação de novos investimentos", afirmou.

Ele afirmou que a medida do governo brasileiro desagradou os chineses, que poderiam desistiram de montar a fábrica no país.

Com alterações no design, nova geração de J3 e J3 Turin

Em Dezembro de 2011 verificou-se que o índice de satisfação dos clientes em relação aos automóveis produzidos no Brasil obteve uma queda de 9,1%, em relação ao mês anterior (Nov/2011). O Índice Nacional de Satisfação do Consumidor (INSC) é um instrumento criado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) para avaliar o grau de contentamento dos brasileiros com produtos e serviços de diferentes segmentos. A avaliação abrangeu percepções dos consumidores em relação às quatro marcas que aparecem na frente no ranking de vendas: Fiat, Volkswagen, Chevrolet e Ford. (Automotive Business, 2012).

Isso encorajou a parceria JAC-SHC, em 28/11/2012, a fazer o lançamento da pedra fundamental da fábrica, em Camaçari - BA. No evento, foi colocado sob a terra um carro do modelo J3; fazendo papel de cápsula do tempo. Mais de duas mil mensagens de funcionários e clientes da empresa, além de fotografias e objetos que deverão ser redescobertos 20 anos após a data. O grupo SHC participaria, então, com 66% do capital, enquanto a estatal chinesa ficaria com os 34% restantes dos quase R$ 1 Bilhão investidos no projeto.

No entanto, as importadoras de automóveis também sofreram com o índice de satisfação dos clientes brasileiros, pelo simples fato que o nível de exigência do consumidor brasileiro mudou, e isso atingiu, também, diretamente a JAC Motors. Em maio/2013, levantamentos feitos com base nas vendas entre maio de 2012 e abril de 2013, computando o número de reclamações confrontados com o volume de vendas, mostravam que as marcas de carros chinesas Chery e JAC eram as "que mais dão dor de cabeça ao brasileiro", no pós-venda (artigo sobre as reclamações registradas no site Reclame Aqui). 

Segundo a JAC Motors, os dados desta pesquisa não refletia, exatamente a situação do setor. A razão seria pelo fato de que as grandes montadoras teriam suas reclamações diluídas entre as concessionárias, enquanto que “a JAC Motors é a única em que as queixas dos usuários, sejam elas pertinentes aos produtos, à marca ou ao pós-venda, são diretamente atreladas ao nome ‘JAC MOTORS’”, explicou em nota enviada pela assessoria de imprensa.

“Quando as queixas NÃO genuinamente direcionadas à rede de concessionárias JAC Motors são exoneradas, nossas reclamações caem de 545 para 103 (81% das queixas do Reclame Aqui são referentes à rede). Deste modo, ao adotarmos exatamente o mesmo método das demais montadoras, temos um resultado de 170 carros vendidos para cada queixa (e não de 32 carros vendidos para cada venda, conforme o levantamento da pesquisa).

No início de 2013, a parceria JAC-SHC havia mudado a estratégia de mercado da companhia no Brasil, que era bem mais agressiva nos dois primeiros anos, dispensando, entre outras coisas, o seu garoto propaganda, o apresentador Faustão, que havia tornado a marca conhecida em todo país.

Então, chegamos a Março/2014, quando a parceria JAC-SHC anuncia uma inversão na composição acionaria da companhia: o empresário brasileiro Sérgio Habib que, até então era sócio majoritário do projeto da fábrica da JAC Motors do Brasil, detendo 66% das ações, enquanto os chineses ficavam com os 34% restantes, passou a ter uma fatia minoritária na futura unidade de Camaçari.

JAC T6, primeiro carro mundial da JAC Motors, será o carro chinês mais moderno do Brasil

Além do mais, anunciou a pretensão de colocar mais dinheiro no projeto, agora orçado em R$ 1 bilhão: 900 milhões para a produção de carros e 100 milhões para a produção de caminhões, com os chineses gerindo diretamente o projeto da fábrica, cujas obras em Camaçari estão atrasadas. O inicio da produção, que estava previsto para o fim de 2014, passou para ter início no 2º semestre de 2015.

Conforme revelou o Jornal o Estado de São Paulo, está entrando no negócio um financiamento da Agencia de Fomento do Estado da Bahia (Desembahia), segundo o Secretário da Indústria, Comércio e Mineração da Bahia, James Correia, de R$ 110 milhões.

Parte dos equipamentos que serão empregados nas linhas de produção, serão trazidos da China, mesma estratégia adotada pela Chery, outra montadora chinesa que está construindo sua fábrica em Jacareí - SP, e que também teve sua inauguração adiada.

A JAC vendeu 23,7 mil automóveis no seu primeiro ano de operação no Brasil, volume que caiu para 15,9 mil veículos ao longo de 2013. Após aderir ao Inovar-Auto e confirmar a fábrica na Bahia, a companhia teve o direito a uma cota de importação sem a taxa extra de IPI sobre importados. 

Atualmente, sob a bandeira JAC estão 70 concessionárias, espalhadas por 18 estados e mais de 40 cidades. Essa extensa presença garantiu, em Julho de 2013, o montante de 50.000 unidades vendidas desde o início da operação, montante que era esperado para as vendas, apenas ao longo do ano de 2012.

Uma das boas razões para se desejar o sucesso e boa sorte para o empreendimento da JAC Motors do Brasil, é a de que, mesmo não havendo promessa alguma, ela ser uma das reais possibilidades existentes, para que os desejáveis Veículos Elétricos (VEs) possam chegar mais rapidamente ao mercado brasileiro.

Dois dos Veículos Elétricos da JAC Motors - à esquerda, o Tongyue e à direita, o yueyue

Em 2013, foi anunciado um acordo entre a montadora chinesa e a norte-americana Green Tech Alliance para exportar pelo menos 2.000 de seus veículos elétricos puros para que a GreenTech Automotive os venda nos EUA. Não se sabia, entretanto, qual veículo da JAC ao certo seria, mas o Tongyue e yueyue parecem os candidatos mais prováveis (enquanto que a própria JAC fala sobre o J3 Turin).

A previsão é que a produção dos veículos movidos a energia elétrica da JAC possa ser iniciada lá nos EUA, expandindo a linha do MyCar, um automóvel de dois lugares da GreenTech, para a linha para um sedan de 5 lugar. No entanto, a ideia inicial é exportar os veículos com tecnologia limpa para da China para os EUA, e também para outros países.

O projeto prevê que a bateria de 19 kWh seja capaz de entregar uma autonomia de 81 milhas, segundo especialistas norte-americanos (161 km, segundo a JAC), com um processo de recarga entre 6 e 8 horas. Inicialmente, os 2.000 carros, que estão previstos para fabricação, serão destinados apenas ao mercado dos EUA. O modelo escolhido para carregar a bandeira de tecnologia aliada a sustentabilidade é o J3 Turin. A Green Tech, na época, contava em uma linha praticamente inoperante apenas com o MyCar, um automóvel de dois lugares. A expansão da linha para um sedan de 5 lugares parece torna-se natural.

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