sexta-feira, 27 de julho de 2012

Carregamento Wireless (sem fio) dos VEs



Você algum dia já desejou que o tanque de combustível do seu carro fosse, magicamente, cheio de gasolina a cada manhã que você acordasse? Você já desejou não precisar conectar o cabo do seu telefone celular durante a noite para poder carregá-lo? Claro, né! Ambas essas coisas soam incríveis mas, a total falta de existência delas não impediria você de usar o  seu carro ou o seu telefone celular.

É por sua causa, que vem surgindo anúncios interessante, sobre parcerias, entre fabricantes de carros e de celulares, como o caso da BMW com a Siemens e, agora o da Renault com a Qualcomm: eles estão entrando no negócio de Recarga de Veículos Elétricos Wireless. Sim, mais um wireless da vida, só que agora um tipo um tanto diferente, não é focado em transmissão de dados ou voz, mas sim, para transferência de energia elétrica – wirerless de potência e, de relativamente bastante potência.

Nós precisamos mesmo disso? Como isso funciona? Na verdade, nem mesmo comercialmente a ideia é nova: Escovas de dentes Oral-B recarregáveis fabricadas pela empresa Braun têm usado o carregamento wireless, ou carregamento indutivo, desde o início de 1990 e, nos anos recentes, alguns telefones celulares e tablets tem buscado emplacar essa ideia.

Mas todos esses são equipamentos de muito baixa potência e requerem pouca energia para o recarregamento da bateria, bem menores que 0,1 kW.h. Como ficaria para recarregar uma bateria de um VE puro que pode ter uma capacidade de energia de 20kW.h, 25 kW.h (tipo do Nissan LEAF) ou mais (bastante mais, no caso dos Tesla Modelo S)? (repare que um Toyota RAV4 EV possui bateria de íons de lítio de 41,8 kW.h, enquanto que, um poderoso Tesla modelo S de luxo é equipado com bateria de íons de Lítio de 85 kW·h).

Bom, seja baixa ou alta potência, o principio básico usado é o mesmo: carregamento por indução eletromagnética, tecnologia que remonta aos primórdios, mesmo anteriores ao do emprego massivo da eletricidade, quando em 1820, pela primeira vez, Christian Oersted, pode observar a correlação de existência entre eletricidade e magnetismo.

Tal correlação passou a ser dominada a partir de enunciados de diversos pesquisadores, cuja integração resultou na chamada lei de Faraday – Neumann - Lenz, ou lei da indução eletromagnética, que quantifica a indução eletromagnética. Indução eletromagnética é um fenômeno natural pelo qual existe produção de corrente elétrica em duas situações:
  • Em um circuito condutor imóvel colocado sob efeito de um campo magnético variável, ou;
  • Em um circuito condutor que é movimentado dentro de um campo magnético constante.
Na verdade essa lei é a base do funcionamento de muitos dispositivos elétricos, todas as máquina elétricas, como alternadores, dínamos, motores e outros mas, o mais importante no caso do carregamento indutivo são os transformadores, cujo princípio está relacionado com o primeiro caso: um circuito condutor imóvel colocado sob efeito de um campo magnético variável.

Isso significa, inexoravelmente, que para a energia ser transferida de uma bobina primária (fonte de energia) para uma bobina secundária (receptora de energia) a corrente elétrica que circulará na bobina primária, precisará, sempre manter-se variando, de modo que o campo magnético resultante dessa corrente, seja variável também, a fim de poder causar indução sobre a bobina secundária, pois ambas as bobinas se encontrarão imóveis quando a operação de carregamento estiver em curso.

Em outras palavras, esse carregamento só poderá ocorrer, transferindo ao VE energia elétrica, se ele operar empregando Corrente Elétrica Alternada (CA), uma vez que a Corrente Elétrica Contínua (CC) não é capaz  produzir indução eletromagnética por prover um campo magnético apenas fixo, em termos de polaridade e de intensidade (isso é fato, se o VE estiver sendo recarregado parado, pois, se pensarmos em carregamento com ele se movendo, a coisa poderá mudar) .

O diagrama a seguir ilustra a ideia básica do carregamento wireless:


Uma principal desvantagem natural deste sistema, é, obviamente, quanto a eficiência energética: O carregamento feito por meio de um transformador significa a inclusão duas etapa a mais na cadeia de transformação de energia comparativamente às que já existem quando o carregamento é feito diretamente por conexão a cabo de força.

Em um transformador, a energia é passada de elétrica para magnética (corrente elétrica no primário para campo magnético) e depois é reconvertida de energia magnética para energia elétrica (do campo magnético para corrente no secundário). Como todo processo de conversão só pode ser realizado, na prática, sobre a penalidade de alguma perda, por menor que seja, o rendimento do transformador será menor do 1, significando perdas extras adicionadas.

Além das bobinas do transformador de ambos os lados, o carregamento indutivo, na forma como está sendo proposto, requer também um aparato eletrônico de comunicação de dados, para realizar negociações de ajuste da corrente demandada no carregamento, bem como servir de realimentação a fim de controlar um ótimo posicionamento do carro, que contém o elemento do secundário, em relação ao primário do transformador da estação que está fixado no piso, aumentando a complexidade e custo de produção.

Tratando-se de Smart Grid, tal comunicação, por via de sinal de rádio, poderia ser dispensada e as informações entre o VE e a estação de carregamento poderiam ser trocadas por meio da própria rede elétrica (existência do transformador não é um impedimento para isso, tal como as experiências práticas com Smart Grid atuais têm demonstrado). Nem mesmo para realimentar informação de posicionamento, o aparato de comunicação extra se faria necessário, podendo, as técnicas de Smart Grid, serem aproveitada também para isso.

Recentes abordagens para reduzir as perdas de transferência através da utilização de bobinas ultra finas, de frequências mais altas, usando tecnologia de ressonância magnética e unidade eletrônica gestora de carregamento optimizadas, demonstram resultar em carregadores e receptores mais eficientes (86% de rendimento, entregando 6,6 kW de potência a partir de um consumo de energia de 7,68 kW) e compactos, facilitando a sua integração em dispositivos móveis, porém a um custo maior e, ainda assim, com um rendimento relativamente baixo.

A fim de diminuir a perda, um sistema de acoplamento móvel, pode ser implementado na estação de carregamento wireless, um dispositivo especial de alinhamento, não apenas para proceder a um alinhamento vertical em relação ao plano, mas para fazer subir a elemento indutor, antes de efetivar o inicio do carregamento, reduzindo a distância de lacuna do "entre ferro", grande responsável por perdasao mínimo. 

Então alguém da Siemens anunciou que “o nosso conceito de transmissão indutiva de energia tornaria possível recarregar automaticamente veículos como táxis, enquanto eles estão à espera nos pontos de táxi." Óbvio que isso deve ser verdade, afinal, a Síemens é, desde muito tempo, uma potência mundial respeitada em eletroeletrônica, assim como os trens Maglev podem levitar e, apesar de diferenças tecnológica, estão, de fato, flutuando no Japão, na Alemanha, na Coreia e na China.

Tecnicamente isso é maravilhoso mas, essa tecnologia é viável economicamente? Mesmo podendo fazer, por exemplo, a ponte Rio-São Paulo no mesmo tempo que os aviões, a resposta é: Não! O investimento necessário para instalar linhas totalmente novas é enorme - enquanto os trens-bala comuns podem aproveitar as ferrovias já existentes.

O primeiro Maglev, de tecnologia alemã, inaugurado a algum tempo na China, fazendo a ligação entre a cidade de Xangai e o seu aeroporto, num percurso apenas pouco superior a 30 km de distância, custou, segundo múltiplas fontes de informação, algo entre US$ 1,2 e $ 1,35 bilhões para ser construído. Respeitando a proporção da distância de percurso, se fosse entre o Rio e São Paulo, custaria, honestamente e, sem contar a inflação do dólar ocorrida em 10 anos, de US$ 15 a $ 17 bilhões.


Depois dessa obra Sino-Germânica entrar em operação, em 2004, essa tecnologia ainda não conseguiu encontrar caminhos que viabilizem a sua expansão para outras aplicações comerciais, nem mesmo dentro da grande e poderosa China. Planos de expansão e novas construções tiveram os trabalhos suspensos em 2008 e, tanto o público quanto o governo local de Xangai, passaram a questionar, não apenas o elevado custo dos projetos relativos a esta tecnologia mas, também, questões ligadas a temores de radiação, devido ao elevado campo magnético variável ao longo de todo o percurso.

Com isso criou-se uma demanda para que futuras construções de linhas de Maglev na China passassem a ser subterrâneas, para aliviar possíveis efeito de poluição eletromagnética e a decisão final sobre expansão ou novas linhas de Maglev teria que ser aprovada pela Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma.

Pensando-se em Maglevs, alguém poderia sugerir a construção de pistas rodagem de carros elétricos, dota das com encrustamento de magnetos (imã), ou de eletromagnetos, de polaridade fixa, implantados, distribuídos alternadamente com polaridades opostas, ao longo de rodovias, os quais poderiam induzir corrente elétrica a um VE, mesmo enquanto ele se movimenta (nem precisaria, necessariamente, levitar).

As questões de obstáculos a tais tipos de sonhos tecnológicos são, além dos custos de implementação de infraestruturas mirabolantes, que são verdadeiramente enormes, também os possíveis efeitos da poluição por radiação, prováveis mas impossíveis de se avaliar quanto as consequências ou mesmo quantificar, verdadeiramente, hoje em dia.

O primeiro Maglev urbano aberto ao público, fora da China, foi em Daejeon, Coreia só Sul, em 21 de abril de 2008: após 14 anos de desenvolvimento e construção o Maglev urbano é executado em um percurso de inexpressivo 1 km. Hoje em dia, Maglev e mais um símbolo da atitude progressista da China e encarna extravagância chinesa. Já, países desenvolvedores como Japão e Alemanha o usam para propósitos de pesquisa e também para apostar corridas, visando quebrar, sucessivamente, recordes de velocidades.

Assim como os Magleves, os carregadores de VEs wireless também geram radiação eletromagnética (poluição invisível), porém apenas localmente, nas proximidades do seu local de instalação e durante a operação do carregamento.

Todavia, os VEs não vieram para ser, apenas, mais uma extravagância mas, sim, como fruto do desenvolvimento de uma solução prática e inteligente, para o mercado de larga escala, dentro de um contexto de disputa econômica feroz: vale lembrar que, com o sucesso dos VEs estaremos estabelecendo uma diminuição na dependência do petróleo a nível mundial e isso gerou, tem gerado, e está gerando, muitos e poderosos inimigos contra a sua causa, o que a faz tender, portanto, a ser constantemente perseguida, visando, até mesmo, a sua total desarticulação.

Toda tecnologia a ser desenvolvida no contexto dos VEs é bem vinda, contudo, toda ideia extravagante e pouco viável economicamente, poderá, num primeiro momento, ser contraproducente e servir de munição, para quem busque motivos apenas para causar descredito da solução de mobilidade por meio do emprego da tecnologia dos VEs puros. Então, quem deseja e aposta no sucesso dos VEs, há que faze-lo bem e cuidar de evitar pedras de tropeço no caminho a ser percorrido por essa causa.

Contudo, eu devo esclarecer que não sou contra ao carregamento wireless mas, em termos de infraestrutura de abastecimento, os custos implantação podem se tornar um impedimento para se adotar o carregamento wireless como uma Forma de Carregamento Padrão. Todavia, ele é bem vindo como um acessório opcional, de preferência pensando em que ele seja instalado fora das linhas de produção dos EVs.

Pensem bem: Se nós exigíssemos dos carros tradicionais a metade daquilo que estamos exigindo dos VEs, nós simplesmente ainda estaríamos andando a cavalo e sonhando com espaçonaves. Os fabricantes de VEs tem que ser posicionar quanto a isso e saber separar devaneios de necessidades básicas. Primeiro façamos o simples, depois vamos ver o que mais é possível com as tecnologias em desenvolvimento.

Não é maximizando em sofisticação que os VEs se tornarão viáveis curto ou médio prazo. Não é estimulando o delírio de consumo extravagante das pessoas que as grandes corporações obterão exito em faturamento, contribuindo com a causa dos VEs. Será que nós podemos, realmente, ser tão preguiçosos que precisamos de uma solução para evitar simplesmente ligar uma tomada? Uma operação manual que consumirá 15 segundos do nosso dia?

Se você quer mesmo mostrar que é um camarada tecnológica e ecologicamente correto e moderno, você deve pensar que, independente se o carregamento do seu VE for feito por via de um cabo de força, ou por um meio wireless qualquer, a programação da hora de início do carregamento, muito provavelmente, terá que ser feita, para se ajustar de modo a evitar os horários de pico de demanda de energia na rede elétrica. Isso deverá ocorrer, principalmente aqui no Brasil, que ainda é o país do chuveiro elétrico.

Muito provavelmente você deverá programar o início da operação de carregamento para bem tarde da noite, num horário em que, muito provavelmente você já estará, ou ao menos desejaria estar, dormindo. Teclar na IHM do carro para programar o horário de início do carregamento levará mais tempo do que encaixar a tomada do cabo de força.

A economia dos VEs não vai se tornar robusta, na realidade, porque temos carros capazes de se auto abastecer, capazes de se pilotar automaticamente, ou que sejam capazes de levitar, ou mesmo de viajar no tempo com seus capacitores de fluxo. O mercado de VEs vai crescer a medida que os fabricantes fizerem carros consistentes, a preços acessíveis, com autonomia razoável e que levem as pessoas para onde elas precisam ir, o resto é vaidade: assim como os norte-americanos preferem os interiores mais escuros, os japoneses já os preferem mais claros e, gostos não se discute.

Tempos de carregamento que tendam a ser menores, também faz parte da consistência do VE desejado e nem precisa ser tão rápido se feito em casa, mas uma carga completa em 6 horas ou menos é necessidade desejável, para que se possa encaixar a operação de carregamento em horários de baixa demanda de consumo de energia. De resto, em nada deve-se exigir que os VEs sejam melhores que os carros convencionais.

O sistema de carregamento indutivo não é uma boa aposta antes de 2025, pois ele de fato trás mais problemas do que soluções, nesta etapa de anos iniciais em que a economia dos VEs estará crescendo paulatinamente. O sistema de carregamento indutivo trás, reconhecidamente, um grande complicador: A implantação de carregamento indutivo sem fio requer inter operacionalidade entre os carros e os sistemas viários, dentro de padrões múltiplos, em todo o mundo. Isso foi recentemente reconhecido por Jacques Hébrard, vice-presidente da Renault, em um comunicado conjunto com Qualcomm.

Der fato, a tecnologia de carregamento wireless para VEs, encarece tanto a infraestrutura, quanto o próprio carro e, se ela não é algo desnecessária (e tirando o menor risco contra choque elétrico ela me parece, atualmente, supérflua), ela está, no mínimo, por demais imatura e deve continuar sendo desenvolvida e testada, por mais um tempo, antes que venha, prematuramente, causar algum dano a já complicada peleja dos VEs.

Os VEs são carros, simplesmente carros, carros absolutamente normais, exceto que eles não usam uma única gota de gasolina. Isso, para mim é muito legal. Não me importo que ele não se parece com uma nave espacial interestelar e ele não esteja, arrogante, batendo no peito e dizendo: “Eu sou elétrico, eu sou elétrico, eu sou elétrico”. Não! Isso tudo é vaidade tola! Ele apenas nos diz: “Eu sou um VE, o seu próximo carro! Fique calmo, você vai ser feliz comigo!”

Veja Também:


Redes Elétricas Inteligentes (Smart Grid) e os Veículos Elétricos





Recarga Indutiva - E-Mobility (ABVE - Vídeo cedido pela SEW-Eurodrive)

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